quarta-feira, 27 de abril de 2011

Seu filho é um bully?



Para cada vítima, há pelo menos um agressor. Se não for detido, esse comportamento violento vai ter consequências ainda mais graves quando ele atingir a vida adulta

Publicado em 27/04/2011 | ADRIANA CZELUSNIAK
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Quem pratica o bullying, a agressão que ocorre principalmente no ambiente escolar e traz inúmeros prejuízos físicos e psicológicos a crianças e adolescentes, é chamado de bully. Infelizmente, mesmo com toda a discussão acerca do problema, vemos os holofotes voltados apenas às vítimas desse fenômeno. Pouco se fala sobre quem está do outro lado, o agressor.

Há quem acredite que os bullies são crianças com baixa autoestima, que precisam se impor sobre os outros para compensar a própria falta de autoconfiança. Que cresceram em famílias violentas ou são crianças que já foram vítimas e que se vingam descontando o que passaram nos outros. Tanto uma quanto outra afirmação podem estar corretas, mas é preciso lembrar que cada caso deve ser avaliado, considerando a criança, sua família e a escola que frequenta.

O bullying pode ser comparado a uma metáfora da psicologia. Um vendedor de maçãs, que sempre se surpreendia com algumas frutas podres dentro de seu barril, se cansa de todos os dias ter de jogar fora algumas e resolve investigar o caso a fundo. Retira todas e então entende por que descartar as que haviam apodrecido não adiantava. O problema era o barril, que estava tomado pelo mofo.

Saiba mais
A indiferença da escola
Priscila Forone/Gazeta do Povo

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Marisa H., vítima de bullying
Combate

Enfrentando o problema

Assim como uma atividade física pode ser boa para prevenir o bullying e melhorar a autoestima das vítimas, os benefícios se estendem aos que têm tendência a um comportamento mais violento. Segundo o professor de Jiu Jitsu Júlio Migliorini, da equipe Gile Ribeiro, as lutas têm sido usadas como ferramenta preventiva em escolas. “A arte marcial traz equilíbrio emocional, o que ajuda os jovens quando precisam ter calma para resolver um problema. Os valores ensinados, como o respeito e a disciplina, aumentam a autoconfiança e as aulas ajudam no desenvolvimento motor e emocional, pois o praticante aprende a ganhar e a perder”, conta.

Maria Maluf concorda que os esportes e as lutas podem ajudar, pela disciplina e energia que exigem. Mas ressalta que matricular o filho na academia não resolve o problema. “Mesmo nos esportes, temos aqueles que são mais fraquinhos e com menor desempenho. Se o esporte for obrigatório e se esses não forem incluídos e ajudados, podem continuar sendo vítimas de bullying. Crianças e adolescentes precisam da vigilância dos adultos e da eterna e necessária transmissão de valores morais e éticos, dentro de casa e na escola”, diz.

Entenda

Bullying é um termo em inglês que deriva do verbo to bully, que é ameaçar, intimidar ou dominar. Confira mais informações sobre esse comportamento agressivo que acontece entre pares:

Definição

São atos repetitivos de agressão física, verbal, moral ou psicológica, praticados por um ou vários indivíduos contra outro, em uma relação desigual de poder.

Onde acontece

A sala de aula é o local onde o bullying mais acontece, seguida do pátio na hora do recreio e imediações da escola, durante os períodos de chegada e saída dos alunos.

O perfil de quem sofre

Muitas vezes são alunos inseguros, apáticos e sem habilidades na comunicação e nos esportes, mas nem sempre.

Diferença entre os sexos

Nos meninos os atos de bullying costumam ser mais agressivos e hostis, prevalecendo a força física e reações mais diretas e violentas. Entre as meninas, as ações são mais indiretas, com atos de exclusão, invenção de histórias difamatórias, intrigas, fofocas. Por ser mais disfarçado, o bullying entre as meninas pode ser mais difícil de identificar e tratar.

Sinais em vítimas

Crianças e adolescentes que sofrem com essas agressões têm insônia, baixa autoestima e depressão. Podem ter pesadelos constantes e desenvolver transtornos como a fobia escolar, medo exagerado de frequentar a escola, e pensamentos suicidas quando a depressão está instalada. Pelo alto grau de ansiedade, podem apresentar também sintomas físicos como náuseas, vômito e dor de cabeça.

Fonte: Especialistas entrevistados e livro Manual Antibullying para alunos, pais e professores, de Gustavo Teixeira (BestSeller, R$ 20).

Segundo o pesquisador da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Josafá Cunha, mestre e doutorando em Educação, com o bullying essa história se repete. Não basta esperar que um caso ocorra na escola para então ver o que fazer com o aluno. O bullying deve ser encarado dentro do contexto escolar. Mais do que isso, Cunha afirma que a escola tem necessidade constante de avaliar se está sendo um espaço tão organizado quanto precisa ser para que a educação possa ocorrer bem, nas atividades pedagógicas e nas relações sociais. “É preciso analisar se há conflitos mal resolvidos e falta de regras claras em relação ao que seria um comportamento inadequado. Os alunos precisam de referenciais para saber qual estratégia vão usar quando tiverem conflito com um professor ou colega. Se a escola é um espaço caótico, como vamos culpar um aluno pela indisciplina?”, afirma.

Família

Para a psicopedagoga Maria Irene Maluf, quando se pensa em bullying não dá para deixar de avaliar as relações familiares, principalmente em relação aos bullies. “A criança que é agressora, aprendeu de alguma forma esse comportamento e em geral ele é adquirido em casa. Para aprender, basta ter um modelo, mas para ter determinado comportamento, eu preciso de reforço. Normalmente essas crianças têm em casa um pai agressor que é respeitado, ou um irmão que é agressivo, durão, e ganha um certo prestígio. A criança quer ter essa mesma oportunidade”, diz.

Avaliar atentamente o comportamento das crianças e adolescentes e se certificar de que eles não estão envolvidos em brigas e intimidações na escola é um dever dos pais, até mesmo porque a falta dessa vigilância pode custar caro. Estudos já comprovaram que alunos que praticam o bullying tem, na vida adulta, mais chances de abusar de álcool e drogas, de se envolver com o crime, de carregar armas e se envolver em atitudes delinquentes, que vão de furtos e destruição de patrimônio público à violência doméstica.

Marcas eternas

“Brincadeira se faz com quem temos intimidade ou proximidade o suficiente para que aquilo não soe agressivo, mas engraçado. Além de ser feita com humor e até carinho. É algo bem diferente de receber ‘zoação’ ou humilhações constantes. Por eu ser alta, magra e de pele branca, era repetidamente chamada de ‘mandioca descascada’, ‘taquara de medir açude’, contrabando ambulante de ossos’.

É óbvio que alguns colegas me evitavam para não serem os próximos alvos de agressão. A ‘turma dos agressores’ me isolava socialmente. E eu me isolava, pois tinha receio de me aproximar e ser agredida. Uma tarde, voltando do ensaio da fanfarra da escola, duas meninas me chamaram. Pensei que, a partir dali, poderia me tornar amiga delas. Ledo engano. Se aproximaram e me bateram com baquetas, dizendo que bater em osso não doía. Fiquei cheia de hematomas no tronco e nos braços. Não contei em casa pois não queria decepcionar meus pais e porque sabia que a resposta seria, como sempre: ‘Isso é coisa de criança, não dê bola...’

Eu sei que não devia, mas hoje encontro todas aquelas pessoas, quase 20 anos depois, desleixadas, sem estudo e me sinto ‘vingada’. Quando vi a atriz Kate Winslet, também vítima de bullying, recebendo o Oscar e dizendo que dali do alto ela não via nenhum dos seus agressores, me deu vontade de chorar de alegria, uma ‘alegria-vingada’. Mesma reação que tive ao assistir o vídeo do menino australiano Casey Heynes reagindo à violência a que era submetido. Me formei em uma ótima universidade, pratico esportes, sou casada, tenho um bom trabalho. Não foi fácil e ainda não é fácil. Tenho problemas de autoestima, não me sinto segura, não me julgo capaz de muita coisa. Às vezes busco formas de superação, para provar para mim mesma que posso ir adiante. Chega a ser exagerada a minha busca por independência. As marcas do bullying que sofri se refletem até hoje. É como se fosse, no dizer de Fernando Pessoa, um cadáver que procria.”

Marisa H., vítima de bullying.

Chat

Nesta quarta-feira (27), às 15 horas, a coordenadora-técnica da ONG Projeto Não-Violência, Adriana Araújo Bini, participa de um chat na Gazeta do Povo sobre o bullying. Envie suas perguntas para educacao@gazetadopovo.com.br Para acompanhar o chat, acesse o www.gazetadopovo.com.br/ensino

Um comentário:

  1. Olá!

    Achei interessante essa matéria sobre o bullying porque mostrou que o agressor também pode ser uma vítima da sociedade.
    Não devemos mesmo nos esquecer que, antes de serem agressores, também estão na minoridade e precisam de acompanhamento médico e/ou familiar.

    Post muito informativo! Obrigada!!!!

    Um abraço,
    Mary:)

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